Muitos que acompanham o Blog Dentro Da Viatura já viram aqui os vários artigos que escrevi e as várias perspectivas desse absurdo cultural brasileiro.
Se olharmos a obrigatoriedade a partir da Lei 9.503 - Código de Trânsito Brasileiro, o famoso CTB, publicada em 1997, veremos como de lá para cá houve um declínio no uso desse precioso dispositivo obrigatório. Como de praxe (e não deveria ser), quando da criação de uma obrigação para o cidadão, num primeiro momento todo mundo passa a cumpri-la por "medo da fiscalização". Imbecil pensar assim, não é? Mas é dessa forma que o povo se comporta. Passado esse primeiro momento, vem uma nova e curiosa etapa, que é separar os conscientes dos acéfalos. O consciente permanece no cumprimento da obrigatoriedade por entendê-la e nesse nosso caso, por acreditar que o cinto de segurança salva vidas. Do outro lado o acéfalo (diferente de descrente) abandona a prática do cumprimento da obrigatoriedade da lei por acreditar que "a poeira baixou", ou que a fiscalização ficou amena, ou mesmo que a obrigatoriedade foi um oportunismo administrativo para arrecadar, com multas, por exemplo.
Só para ilustrar: da mesma forma que a obrigatoriedade do cinto de segurança foi banalizada, isso aconteceu com o respeito à faixa de pedestres, com a Lei Seca e demais pontos do CTB... O senso comum do brasileiro é uma coisa curiosa: primeiro a gente cumpre a lei, depois de um tempo a gente faz de conta que ela não serviu para nada senão para prejudicar os administrados (a sociedade em geral). Pura imbecilidade!
São várias as estatísticas que apontam o desuso do cinto de segurança, sobremaneira no banco traseiro (como se todos os ocupantes não estivessem no mesmo veículo, como se não estivessem à mesma velocidade, como se uns fossem mais blindados do que os outros....). Essa estatística eu tenho na minha cabeça, tenho nos meus registros (sistema eletrônico) de autuações, meus colegas de pista Brasil afora tem nos registros de acidentes, tem nas histórias para contar! Eu também tenho histórias para contar, mas não conseguiria mostrar aqui para vocês o quão impactante é chegar em um local de acidente na rodovia e ver gente morta, ver gente destroçada por estar sem o cinto de segurança. Nem minhas milhares de fotos conseguiriam expressar a dinâmica de um acidente e ainda que fossem filmagens, não materializariam os poderes da velocidade e da inércia. Nunca haverá algo potencialmente efetivo para minimizar resultados trágicos de acidentes senão a consciência de cada um. Se não houver convencimento, pelo menos que haja aceitação da obrigatoriedade desse dispositivo!
O sujeito vai ver crash tests, vídeos de Youtube, reportagens televisivas ou mesmo presenciar acidentes quando em viagens por esse mundão afora, mas só se convencerá da necessidade do uso do cinto de segurança quando sofrer um acidente? Não é possível!!! É inacreditável!!!
Ontem foi o Cristiano Araújo, jovem promessa da música (e não era sertanejo, tá?!) brasileira. Fez muita gente feliz, mas infelizmente virou um "exemplo" de que ignorar um simples ato de afivelar o cinto de segurança é a tênue linha que separa a vida da morte. Quantos mais serão números nessa estatística tenebrosa?
Mas PRFoxxx, como você afirma que ele estava sem cinto? E se o dispositivo tiver falhado? E se isso, e se aquilo?
Sinceramente eu custo a acreditar que pessoas ainda façam essas perguntas na internet e questionem a avaliação da Polícia Rodoviária Federal e da polícia científica de GO nesse acidente de trânsito em questão. Chega a soar patético alguém acreditar que os policiais que atenderam à ocorrência ontem caíram de paraquedas no local, como se nunca tivessem feito um Boletim de Acidente antes na vida. As vítimas de politrauma em questão oferecem mais do que um corpo cheio de fraturas e hemorragia: indicam em si o quanto somos frágeis ante veículos cada dia mais potentes (mesmo com inúmeros Airbags, sistemas de controle de tração e etc). O Boletim de Acidente de Trânsito (BAT) consiste em ¹levantamento do local, ²avaliação dos danos no veículo e ³qualificação dos envolvidos.
1- Levantamento de local é o estudo do pavimento, das marcas de frenagem/derrapagem, ponto de colisão ou ponto de saída, ponto de repouso do veículo, dos corpos, vetorização dos fragmentos e etc. [Isso explicada de forma não técnica]
2- Avaliação dos danos no veículo é a quantificação e qualificação dos danos para caracterização da monta (sem danos > pequena> média> grande). Está diretamente ligada à dinâmica do acidente. Por exemplo, num capotamento o veículo poderá/deverá ter danos (ainda que superficiais) no teto e colunas.
3- Qualificação dos envolvidos é a caracterização dos ocupantes propriamente dita. Levantamento de dados (inclusive para fomentar ação judicial no caso de lide, acionamento de seguro DPVAT e etc) de cada envolvido no acidente diretamente, seja ele condutor ou passageiro, podendo abranger testemunha (envolvido indiretamente) a depender do caso.
Enfim, o importante é ver que nesse exemplo da morte do cantor Cristiano Araújo a imprensa colocou em evidência o uso do cinto de segurança. É imprescindível trazer esse assunto a tona e, quem sabe, chamar a atenção da sociedade para a banalização da vida; trazer para o foco das discussões nas Redes Sociais que um simples gesto de auto-proteção é natural do ser humano.
Como falo sempre: se você não usa o cinto de segurança por acreditar que ele é irrelevante para o resultado, que o faça por ser obrigatório ou vice-versa, apenas use e mantenha-se vivo. Fica a dica daquele que frequentemente "recolhe pedaços" de gente como você, que achava que para ir "só ali" não precisava de cinto de segurança, mas que não voltou para casa para contar história; virou saudade, virou número!
PRFoxxx