Autor de estudo que critica os métodos de seleção de funcionários públicos no País, professor da FGV propõe o fim das provas de múltipla escolha e das taxas de inscrição.
Os concursos públicos no Brasil não foram feitos para escolher os
melhores candidatos. Essa é a opinião do professor de Direito da FGV
Rio, Fernando Fontainha, crítico voraz do sistema que filtra os
ocupantes de cargos públicos no País.
Para o acadêmico, a ideologia concurseira que se firmou ajuda a
alimentar uma “indústria milionária de cursos preparatórios e um sistema
de arrecadação que desvirtuou os processos seletivos”.
Boa parte destas críticas está no livro recém-lançado “Processos
Seletivos para a Contratação de Servidores Públicos: Brasil, o País dos
Concursos”, fruto de uma pesquisa do Centro de Justiça e Sociedade da
FGV Direito Rio em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF).
Na obra, Fontainha propõe criar um marco regulatório para mudar
radicalmente os critérios de seleção de funcionários públicos no Brasil.
O professor propõe, entre outras ideias, abolir as provas de múltipla
escolha e acabar com as taxas de inscrição. No estudo, aparecem
exemplos de provas em 20 órgãos federais, entre eles Banco Central,
INSS, Polícia Federal e Receita. Para selecionar os candidatos com as
competências mais adequadas, Fontainha sugere que a experiência
profissional prévia seja requisito básico para inscrever-se no concurso.
iG – Por que, na sua opinião, os concursos públicos não são capazes de selecionar os melhores candidatos?
Fernando Fontainha - Os concursos no Brasil são
autocentrados, voltados para si mesmos. Neles, impera a ideologia
concurseira, que acontece em enorme prejuízo do serviço público
brasileiro, sem dúvida alguma. Eles servem para selecionar os que mais
se prepararam para as provas, e não os mais competentes. Isso reflete na
qualidade dos serviços públicos no Brasil.
Como você sugere mudar esse sistema?
Existem duas maneiras de se averiguar os candidatos mais competentes: de forma profissional ou acadêmica. Criamos propostas provocativas de um novo marco regulatório, com 10 itens que passam pelo fim das provas de múltipla escolha e pela necessidade de expor as habilidades e competências exigidas pelas carreiras já no edital.
Você propõe acabar com as provas de múltipla escolha. Por quê?
Com certeza, esse tipo de prova não avalia bem o candidato, é uma prova cheia de macetes. Ela averigua capacidades completamente desligadas das competências acadêmicas. Não são provas de múltipla escolha que os alunos estão acostumados a fazer na faculdade e não elas não vão definir o que farão na carreira. As questões de múltipla escolha não avaliam nem competências acadêmicas, nem profissionais. Esse é o problema. Todo mundo sabe como se treina para essas provas em cursinhos. Você pega os truques e técnicas para escapar das pegadinhas.
Deveria haver uma prova prática para substituir o método atual?
Nós sugerimos que sim. Ou prova prática ou requisitos de experiência prévia. O médico do Ministério da Saúde faz apenas uma prova de múltipla escolha para ser admitido. A única exigência é de que ele seja bacharel em medicina. Isso é no mínimo questionável. Mas não quero parecer elitista.
O cargo de técnico do INSS, que pede ensino médio, e que em 2012
recebeu quase um milhão de candidatos, é alguém que fica atrás do balcão
atendendo pessoas. Ele é avaliado por uma prova de múltipla escolha,
com questões de direito previdenciário, português, informática. Mas a
competência fundamental pra prestar um bom atendimento público não é
avaliada, apesar de ser fundamental.
A ideia seria selecionar apenas pessoas com alguma experiência prévia?
Seria uma solução muito simples pra diminuir essa quantidade alucinante de inscritos e, com certeza, aumenta as chances de contratar pessoas que vão prestar um bom serviço. Exige que, para se inscrever, a pessoa comprove que tem cinco anos de experiência com atendimento ao público. Isso não é elitista, pelo contrário. Você exige que a pessoa demonstre que durante cinco anos ela foi caixa de supermercado ou balconista de farmácia por exemplo. Aquele sujeito que hoje tem condições de ser liberado para se preparar para os cursinhos não vai poder concorrer ao cargo, por exemplo.
Na sua opinião, os concursos públicos favorecem pessoas de nível social mais elevado?
O concurso público hoje é uma máquina de exclusão social, e não de inclusão. Esse sistema é voltado para quem tem tempo e dinheiro para pagar um bom cursinho. Pra quem pode pagar um bom colégio, que já no ensino médio ministra disciplinas para preparar o seu filho para os concursos da administração pública. Esse é um dos reflexos perversos da ideologia concurseira. Pra fazer cursinho, você precisa ter tempo. E ter tempo é poder não trabalhar. O brasileiro que sai do ensino médio e precisa trabalhar estará concorrendo em desvantagem com alguém que pode ficar só em cursinhos. É uma máquina de injustiça social.
Por que vocês acham necessário eliminar as taxas de inscrição dos concursos?
No Brasil, se acha natural pagar para fazer um concurso público. Mas não é assim em todos os países do mundo. Temos um capítulo no livro que mostra uma comparação com a França, onde ninguém nem compreende dizer que você vai pagar uma taxa para prestar um concurso. É um verdadeiro absurdo por lá, mas aqui é normal.
Mesmo com a taxa, os concursos recebem um grande número de candidatos…
Para essa máquina poder funcionar, é preciso haver um contingente enorme de pessoas que não param de fazer provas, uma atrás da outra. A ideia de vocação, de desejo de um cargo desaparece diante da ideia de que se vai sair fazendo vários concursos por aí, até passar em algum. Isso é ser um concurseiro profissional, faz parte da sua ideologia se inscrever para todos os cargos que puder. Ele não sabe se gostaria de trabalhar com previdência ou ser policial. Mesmo que não queira fazer aquilo da vida, vai pelo salário, pela estabilidade e por outras vantagens que a vida de funcionário público oferece.
Por isso vocês propõem também que o candidato não possa prestar mais de três vezes o mesmo concurso?
Sim. Isso acontece na França. Você só vai se inscrever se achar que tem condições reais de passar. Vai acabar com essa coisa de prestar por prestar. E inverte essa relação de cliente que existe nos concursos. Quando você instaura uma taxa, está privatizando a relação. Por isso é um problema grave no Brasil. O que se discute hoje não é a qualidade do serviço público e do recrutamento, mas o rol de direitos dos concurseiros. Acho que tem que haver esses direitos, mas o foco do concurso é pensar num recrutamento que vai ampliar a qualidade da prestação do serviço público. Esse deveria ser o foco principal.
As bancas examinadoras também precisariam mudar?
Sim. Dependendo do foco, dizemos que todo serviço público precisa ter uma escola profissional. Se você recrutou o candidato, agora tem que formá-lo. A menos que seja um concurso que já recrute profissionais gabaritados no mercado. Pela nossa proposta, metade da banca tem que ser formada por acadêmicos da área. Existem até membros de banca profissionais. A gente propõe que isso acabe. O profissional vai pra a banca e publica um livro que deve ser lido pelos candidatos. O ideal é que se ele participou de uma banca, tem que ficar dois anos sem participar de novo. No caso de um concurso de vocação profissional, que a banca seja composta por profissionais não acadêmicos com pelo menos 10 ou 15 anos de experiência comprovada na área.
Fonte: IG
PRFoxxx
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Não sou especialista nem nada, mas a ideia é horrivel.
ResponderExcluirDiz que "Não são provas de múltipla escolha que os alunos estão acostumados a fazer na faculdade e não elas não vão definir o que farão na carreira. As questões de múltipla escolha não avaliam nem competências acadêmicas, nem profissionais. Esse é o problema.
Na frase "Você exige que a pessoa demonstre que durante cinco anos ela foi caixa de supermercado ou balconista de farmácia por exemplo.". Ok, então se eu tenho 18 anos, quero prestar um concurso, não vou poder, pq não tenho experiencia previa? Isso não é excluir? Sem contar que nem sempre quem está atras de um balcão com atendimento ao publico é a pessoa mais educada e compreensivel do mundo. Educação vem de casa, independente de experiencias anteriores empregaticias.
Ora, mas muitos especialistas da Educação tbm dizem que provas de Escola e Faculdade tbm não avaliam o verdadeiro conhecimento do aluno. E agora? Trocaremos 6 por meia duzia. Sem contar que, com exceção das cotas, concurso publico assim é muito justo e democratico. Entra quem estudou mais. Infelizmente, diferenças sociais sempre haverá. O Rico terá mais tempo de estudar que o pobre, mais capacidade de cursinhos melhores e td o resto, porém, são coisas da vida. Isso já é problema do Governo resolver, não das Bancas Examinadoras.
Claudio, publiquei esse texto exatamente para confrontar pontos de vistas dos leitores. Concursos de forma geral, sobremaneira o vestibular, é um grande gargalo social, mas penso que mudar a regra do jogo no meio da etapa é uma desfaçatez tamanha. A educação brasileira desde a base faz ruir o topo; não é criando cotas ou mudando o ponto crítico (concurso) que se corrigirá distorções que vem se acumulando desde as séries iniciais. Se as provas não são a forma ideal (utópica) de testar a capacidade de ser servidor público, tem sido a menos inadequada.
ExcluirExatamente meu caro. A base da educação faz ruir todo o resto. Sua frase final resume toda a minha opinião: "Se as provas não são a forma ideal (utópica) de testar a capacidade de ser servidor público, tem sido a menos inadequada."
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