sábado, 28 de fevereiro de 2015

No Olho do Furacão


Artigo - O protesto dos caminhoneiros na visão de um
Policial Rodoviário Federal
Por PRFoxxx

Desde que as primeiras movimentações foram registradas aqui no estado (primeiro em rodovias estaduais), nunca pude imaginar que eu seria um participante deste importante e complexo "momento histórico" do país.
"Sem querer" acabamos sendo afetados por essa manifestação popular que tomou proporções nacionais num momento pelo qual passa o país, tanto politicamente, quanto economicamente. Nesses 2 pilares, atrelados fortemente, a imensa categoria dos transportadores de carga se provocou a fazer um protesto ordeiro e pacífico para mostrar o descontentamento com o rumo que o país tem tomado. Mas qual foi o estopim de tudo isso, de acordo com eles: a alta do Dísel. Para aproveitar o ensejo, resolveram pleitear um tabelamento do frete (reivindicação nada plausível, como pode ser muito bem elucidado no artigo de Reinhard RammingerO Estranho Bloqueio de Estradas - Leia Mais). De lá para cá, o movimento se deformou tanto para o mau como para o bom sentido, facetas e atores que passo a descrever agora com a minha percepção de quem está no olho do furacão.
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Adesão de outros setores econômicos

De oportunistas a rebeldes sem causa, hoje o movimento agrega um amplo leque de cidadãos, empresários, políticos demagogos e revolucionários de internet todos com um objetivo comum: demonstrar a insatisfação com a política econômica vendida na eleição como uma coisa, mas que foi entregue outra. Há um PROCON para reclamarmos da propaganda enganosa do PT e da Dilma? Não, por conseguinte a sociedade procurava um estopim para reagir a esse descalabro da política corrupta (histórica) que tem escândalos semanais, cuja conta $$$ quem paga é o povo. Os caminhoneiros, que desconhecem o poder que tem, começaram timidamente e de certa forma desorganizados (trocando ligações e mensagens de Whatsapp) a fazer um bloqueio aqui, outro ali, e a notícia na "rádio caminhão" correu o Brasil e logo se espalhavam estrangulamentos de rodovias em 8 Estados. Hoje vi comércio fechado, carreatas e comboios de máquinas agrícolas somando nos pontos de bloqueio para gritar BASTA em uma só voz! Será prelúdio de uma "Primavera Brasileira", como já se tem lido em algumas redes sociais?!

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O rebelde sem causa

Como para toda regra tem sua exceção, nessas conversas de beira de rodovia vi e ouvi de muitos caminhoneiros manifestações de diversas naturezas, algumas sem nexo algum; outras até razoáveis, mas o que me chama a atenção é que muitos ali não sabiam efetivamente do que se tratava aquele protesto. Só tinham a ideia de que tinha que baixar o preço do Dísel, independente dessa redução vir de uma redução da alíquota do ICMS, aumento do subsídio ou mesmo a redução "seca" na bomba. Faziam contas e mais contas para mostrar que hoje são "mendigos da rodovia", que são coitados, que as vezes rodam vazios porque os fretes não compensam e blablabla, MAS se esqueciam do fato de que é impossível tabelar frete (ir contra a Lei natural de Oferta x Demanda) e que deviam sim era cobrar a quebra do "oligopólio" de uma meia dúzia de empresas com milhares de caminhões que operam aqui no estado e regem o valor dos fretes em comum (e sujo) acordo com as cerealistas como a Bunge, ADM, Amaggi, Cargill e etc. Ignoram também o fato de que é impossível chegar a um valor comum quando, por exemplo, se estabelece (valor hipotético) R$ 10,00/Km rodado para transportar 20t canos de PVC ou 20t de cimento: o veículo trabalha de formas diferentes, tem consumo absurdamente diferente de combustível e pneus, dentre outros fatores como desgaste de suspensão, maneabilidade da carga e etc.

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Os coagidos

Em absolutamente todos os dias, todos os plantões das Unidades Operacionais aqui do trecho (e acredito ter sido regra ao longo do país), recebemos acionamento para intervir em conflitos entre caminhoneiros nos pontos de bloqueio. Aqui só entre caminhoneiros, pois a "coordenação" do movimento tinha como diretriz a restrição de circulação somente dos transportadores de carga seca, excetuando da retenção os automóveis/caminhonetes, ônibus, cargas perecíveis e grãos/sementes que seguiam das lavouras para os silos. A princípio os caminhões de combustíveis também estavam sendo retidos, o que provocou desabastecimento em toda a região e levou a um caos no trânsito, filas quilométricas na frente dos Postos de Combustíveis e esgotou em 2 dias o combustível previsto para uma semana inteira.

Logo surgiam as primeiras divergências, pois muitos dos motoristas retidos ou não concordavam com a greve ou alegavam motivos pessoais (alguns até absurdos) para não se sujeitarem como os demais "colegas" à retenção. Considerado o fato de que o tal do caminhoneiro não tem mãe, não sabem conversar, não tem argumentos, só sabem se impor pelo tamanho/pela força, imaginem que nível e em que moldes eram essas discussões... Sim, era pior do que vocês imaginam! Hoje, por exemplo, li a notícia de um caminhoneiro que "furou" o bloqueio, foi perseguido por outros, que o ultrapassaram, pararam o carro na frente do seu caminhão e quando aguardavam muito provavelmente para agredi-lo, foram atingidos pelo seu caminhão, vindo um dos "nervosinhos" a ser morto atropelado na rodovia. Aqui no meu trecho não foi diferente: temos notícia de um VW/Fox prata com 3 bandidos (não são manifestantes) que perseguiram e ameaçaram com arma de fogo alguns caminhoneiros que tentaram sair do bloqueio e buscar caminhos alternativos para seguir viagem.
Ainda hoje vi em grupo de Facebook um vídeo gravado por um colega onde a esposa de um caminhoneiro depõe perante a autoridade policial relatando coação por parte dos manifestantes sobre alguns caminhoneiros retidos em um bloqueio na BR163 em Pranchita/PR (onde já trabalhei por 2 meses em 2011).


Que manifestação é essa que se diz pacífica e ordeira, mas que restringe Direitos e limita trabalhadores (que estão há dias longe de casa) de ter sequer uma alimentação e higiene decentes?
Que protesto é esse de uma suposta classe unida que tem caminhoneiros em vias de fato tendo que ser separados por colegas ou policiais?
Que legitimidade esses caminhoneiros tem para bloquear rodovias, quando na semana anterior estavam todos irritadinhos querendo passar por cima de índios que também bloquearam a BR163 há poucos quilômetros dali de um dos pontos onde esses caminhoneiros agora se reúnem para ter ouvidos seus não menos plausíveis anseios? Incoerente, não é?!
Mas mais incoerente ainda é o Governo Federal que assiste bloqueio TOTAL de rodovia federal pelo MST e por Índios, mas "cutuca" o MPF de modo a, de forma velada, falar para a PRF não fazer Uso Diferenciado da Força (Choque - Operação de Controle de Distúrbios), mas quando são trabalhadores, logo judicializa a luta de movimentos classistas como fez agora com caminhoneiros, como fez antes com agricultores e etc... Fica a reflexão!

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Os Policiais Rodoviários Federais

Do lado de cá da história, cá estamos nós sempre a levar pedradas! No Brasil, há o seguinte paradigma: mesmo que esteja certa, dentro da legalidade, a polícia SEMPRE estará errada, simplesmente por ser polícia! O remédio amargo da democracia de um povo covarde, hipócrita, que na hora de protestar é leão, mas na hora de votar é jumento; sempre será vidraça em situações de caos social.

Aqui na pista estamos lado a lado com os caminhoneiros, geralmente solidários com a manifestação de insatisfação com a rédea frouxa do governo para com os corrutos, mas que estala o chicote no lombo do trabalhador.
Não tenha a ingenuidade de pensar que por sermos uma polícia federal estejamos numa situação cômoda, tanto no que se refere às condições de trabalho, quanto à remuneração. Há tempos a Polícia Rodoviária Federal tem sido subestimada pela sociedade, desprestigiada pelos governos tanto do PT como do PSDB e a remuneração defasada reduz nosso poder de compra, enquanto a frota de veículos cresce em Progressão Geométrica, os acidentes aumentam (bem como sua gravidade), a criminalidade toma conta das cidades, mas afetam diretamente o cenário da rodovia (tráfico de drogas, armas, contrabando e etc).
Chega a soar como "se não pode com o inimigo, junte-se a eles", pois somos poucos, geralmente 2 policiais por Unidade Operacional por plantão (para cuidar às vezes de quase 300Km), enquanto os caminhões parados nos acostamentos são dezenas, centenas a depender da região. O que podemos fazer? Temos que nos multiplicar para atender acidentes, combater o crime, e ainda ficarmos de "babá" dos órfãos protestantes para evitar que conflitos aconteçam e a situação saia do controle. O governo está c*gando para a gente como servidores, como profissionais e como humanos.

Aqui na pista, no bloqueio, ombro a ombro com a gente os caminhoneiros a lamentar, criticar o governo, reclamar da coordenação do movimento, contar histórias trágicas e engraçadas de rodovia, tudo parecendo ser muito amistoso; mas querem saber o que acho: todos morrem de ódio da gente e por conta deles fariam ali uma anarquia... e fazem, principalmente quando acham alguém que passa a mão na cabeça deles!
Leia mais em "Houve abuso de autoridade", que é um artigo de um jornaleco da imprensa marrom que dá voz a um advogado mequetrefe que quis seus 15 minutos de fama ao atentar contra o Estado na pessoa dos seus agentes - Policiais Rodoviários Federais - que agiam sob ordem judicial (presumidamente revestida de legalidade) numa ação de controle de distúrbio na rodovia federal. Não sei se tive mais asco de ver esse tipo de lixinho que acha que a carteirinha da OABesta é tudo (ainda mais depois de ter feito faculdade particular $$$) ou se foi da própria OAB/SC numa manifestação de paternalismo porco emitir uma nota de desagravo à ação da PRF. Será mais um modo de impulsionar o garantismo legal pernicioso brasileiro?

Espantam-me ainda as inúmeras manifestações dos especialistas virtuais em segurança pública que comentam nas redes sociais sobre a ação da PRF sem nunca terem ouvido falar o que é Uso Diferenciado da Força, Operação de Controle de Distúrbios ou mesmo terem a lucidez de aceitar que ordem judicial não se contesta, se cumpre. Lamentavelmente vi pessoas (que eu acreditava serem esclarecidas) criticarem a ação policial falando que a polícia é como cachorro mandado da Dilma, que estavam batendo em trabalhadores; essas pessoas sabem muito bem que o policial que está ali dentro daquela farda e daquele pesado exoesqueleto, além de humano é um servidor público e que existe um crime chamado PREVARICAÇÃO, cuja pena pelo fato de deixar de fazer seu ofício é a DEMISSÃO. Ao policial ali no dispositivo não cabe fazer juízo de "devo ou não devo agir e fazer cumprir a Lei?". Mais do que seu dever, é uma necessidade desse ser humano (pai de família, filho, amigo, etc) manter seu emprego, seu ganha-pão; do contrário, quem arcará com suas despesa na justiça tentando reverter uma demissão? Quem o sustentará no decorrer do processo e, caso ele perca, o trará a dignidade e renda de volta? O caminhoneiro que tira livre de 6 a 8 mil Reais mensais em época de safra, ou aquele advogado chiliquento que afrontou a Lei em troca de Likes no Facebook?
Protestar é preciso, mas quando falamos de bloqueio de rodovia temos um cenário de conflito de Direitos: é o rico que quer viajar e reclama seu "Direito de Ir e Vir", mesmo sem saber o que é e que todo direito pode ser limitado; é o caminhoneiro que reclama seu "Direito de Manifestação", pois chega a ser desumano encarar algumas buracovias desse país e ainda pagando preço de ouro num combustível produzido no Brasil, mas que é vendido pela metade do preço nos vizinhos cocaleiros; é o detentor de carteirinha da OAB reclamando seu "Direito de Afrontar o Estado", assim como aparecem outros portadores de direitos que sequer existem; são os índios, são os "trabalhadores rurais" do MST... Semana que vem quem será que ocupará a rodovia: os Nerds, os manos do rolezinho, as ex-BBBs? Brasil é o país onde todos tem Direitos absolutos, mas nenhum Dever, dentre eles o de ser JUSTO, que é o principal e do qual derivariam todos os outros deveres de uma sociedade avançada/progressista.
PRFoxxx

Um comentário:

  1. Disse tudo! Muito bom o texto.
    Parabéns!
    E eu continuo sonhando e estudando pra PRF.
    Abraço.

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