Protesto político não é mote do Blog, mas lendo aqui um brilhante texto da
professora Martha de Freitas Azevedo Pannunzio, de 74 anos, de
Uberlância/MG, resolvi replicar nessa data tão importante. Ela escreveu uma carta para a presidente Dilma que foi
entregue em mãos, ano 2012. Vale a pena ler. É a voz de quem não se cala e não
consente.
BRASIL CARINHOSO
"Bom dia, dona Dilma!
Eu
também assisti ao seu pronunciamento risonho e maternal na véspera do
Dia das Mães. Como cidadã da classe média, mãe, avó e bisavó, pagadora
de impostos escorchantes descontados na fonte no meu contracheque de
professora aposentada da rede pública mineira e em cada Nota Fiscal
Avulsa de Produtora Rural, fiquei preocupada com o anúncio do BRASIL
CARINHOSO.
Brincando de mamãe Noel, dona Dilma? Em ano de
eleição municipalista? Faça-me o favor, senhora presidentA! É preciso
que o Brasil crie um mecanismo bastante severo de controle dos impulsos
eleitoreiros dos seus executivos (presidente da república, governador e
prefeito) para que as matracas de fazer voto sejam banidas da História
do Brasil.
Setenta reais per capita para as famílias miseráveis
que têm filhos entre 0 a 06 anos foi um gesto bastante generoso que vai
estimular o convívio familiar destas pessoas, porque elas irão, com
certeza, reunir sob o mesmo teto o maior número de dependentes para
engordar sua renda. Por outro lado mulheres e homens miseráveis irão
correndo para a cama produzir filhos de cinco em cinco anos. Este é, sem
dúvida, um plano quinquenal engenhoso de estímulo à vagabundagem,
claramente expresso nas diversas bolsas-esmola do governo do PT.
É muito fácil dar bom dia com chapéu alheio. É muito fácil fazer
gracinha, jogar para a plateia. É fácil e é um sintoma evidente de que
se trabalha (que se governa, no seu caso) irresponsavelmente.
Não falo pelos outros, dona Dilma. Falo por mim. Não votei na senhora.
Sou bastante madura, bastante politizada, sobrevivente da ditadura
militar e radicalmente nacionalista. Eu jamais votei nem votarei num
petista, simplesmente porque a cartilha doutrinária do PT é raivosa e
burra. E o governo é paternalista, provedor, pragmático no mau sentido, e
delirante. Vocês são adeptos do quanto pior, melhor. São
discricionários, praticantes do bullying mais indecente da História do
Brasil.
Em 1988 a Assembleia Nacional Constituinte, numa
queda-de-braço espetacular, legou ao Brasil uma Carta Magna bastante
democrática e moderna. No seu Art. 5º está escrito que todos são iguais
perante a lei*. Aí, quando o PT foi ao paraíso, ele completou esta
disposição,
enfiando goela abaixo das camadas sociais pagadoras de
imposto seu modus governandi a partir do qual todos são iguais perante a
lei, menos os que são diferentes: os beneficiários das cotas e das
bolsas-esmola.
A partir de vocês. Sr. Luís Inácio e dona Dilma,
negro é negro, pobre é pobre e miserável é miserável. E a Constituição
que vá para a pqp.
Vocês selecionaram estes brasileiros e
brasileiras, colocaram-nos no tronco, como eu faço com o meu gado, e os
marcaram com ferro quente, para não deixar dúvida d e que são
mal-nascidos. Não fizeram propriamente uma exclusão, mas fizeram, com
certeza, publicamente, uma apartação étnica e social. E o PROUNI se
transformou num balcão de empréstimo pró escolas superiores particulares
de qualidade bem duvidosa, convalidadas pelo Ministério de Educação.
Faculdades capengas, que estavam na UTI financeira e deveriam ter sido
fechadas a bem da moralidade, da ética e da saúde intelectual,
empresarial, cultural e política do País. A Câmara Federal endoidou?
O Senado endoidou? O STJ endoidou? O ex-presidente e a atual presidentA
endoidaram? Na década de 60 e 70 a gente lutou por uma escola de
qualidade, laica, gratuita e democrática. A senhora disse que estava lá,
nesta trincheira, se esqueceu disto, dona Dilma?
Oi, por favor, alguém pare o trem que eu quero descer!
Uma escola pública decente, realista, sintonizada com um País
empreendedor, com uma grade curricular objetiva, com professores bem
remunerados, bem preparados, orgulhosos da carreira, felizes, é disto
que o Brasil precisa. Para ontem. De ensino técnico, profissionalizante.
Para ontem. Nossa grade curricular é tão superficial e supérflua, que o
aluno chega ao final do ensino médio incapaz de conjugar um verbo,
incapaz de localizar a oração principal de um período composto por
coordenação. Não sabe tabuada. Não sabe regra de três. Não sabe calcular
juros. Não sabe o nome dos Estados nem de suas capitais.
Em casa
não sabe consertar o ferro de passar roupa. Não é capaz de fritar um
ovo. O estudante e a estudantA brasileiros só servem para prestar
vestibular, para mais nada. E tomar bomba, o que é mais triste.
Nossos meninos e jovens leem (quando leem), mas não compreendem o que
leram. Estamos na rabeira do mundo, dona Dilma. Acorde! Digo isto com
conhecimento de causa porque domino o assunto. Fui a vida toda
professora regente da escola pública mineira, por opção política e
ideológica, apesar da humilhação a que Minas submete seus professores. A
educação de Minas é uma vergonha, a senhora é mineira (é?), sabe disto
tanto quanto eu. Meu contracheque confirma o que estou informando.
Seu presente para as mães miseráveis seria muito mais aplaudido se
anunciasse apenas duas decisões: um programa nacional de planejamento
familiar a partir do seu exemplo, como mãe de uma única filha, e uma
escola de um turno só, de doze horas. Não sabe como fazer isto? Eu
ajudo. Releia Josué de Castro, A GEOGRAFIA DA FOME. Releia Anísio
Teixeira. Releia tudo de Darcy Ribeiro. Revisite os governos gaúcho e
fluminense de seu meio-conterrâneo e companheiro de PDT, Leonel Brizola.
Convide o senador Cristovam Buarque para um café-amigo, mesmo que a
Casa Civil torça o nariz. Ele tem o mapa da mina.
A senhora se
lembra dos CIEPs? É disto que o Brasil precisa. De escola em tempo
integral, igual para as crianças e adolescentes de todas as camadas,
miseráveis ou milionárias. Escola com quatro refeições diárias, escova
de dente e banho. E aulas objetivas, evidentemente.
Com biblioteca,
auditório e natação. Com um jardim bem cuidado, sombreado, prazeroso.
Com uma baita horta, para aprendizado dos alunos e abastecimento da
cantina. Escola adequada para os de zero a seis, para estudantes de
ensino fundamental e para os de ensino médio, em instalações individuais
para um máximo de quinhentos alunos por prédio. Escola no bairro,
virando a esquina
de casa. De zero a dezessete anos. Dê um pulinho
na Finlândia, dona Dilma. No aerolula dá pra chegar num piscar de olhos.
Vá até lá ver como se gerencia a educação pública com responsabilidade e
resultado. Enquanto os finlandeses amam a escola, os brasileiros a
depredam. Lá eles permanecem. Aqui a evasão é exorbitante.
Educação custa caro? Depende do ponto de vista de quem analisa.
Só que educação não é despesa. É investimento. E tem que ser feita por
qualquer gestor minimamente sério e minimamente inteligente.
Povo educado ganha mais, consome mais, come mais corretamente, adoece menos e recolhe mais imposto para as burras dos governos.
Vale à pena investir mais em educação do que em caridade, pelo menos assim penso eu, materialista convicta.
Antes que eu me esqueça e para ser bem clara: planejamento familiar não
tem nada a ver com controle de natalidade. Aliás, é a única medida
capaz de evitar a legalização do controle de natalidade, que é uma
medida indesejável, apesar de alguns países precisarem recorrer a ela.
Uberlândia, inspirada na lei de Cascavel, Paraná, aprovou, em novembro
de 1992, a lei do planejamento familiar. Nossa cidade foi a segunda do
Brasil a tomar esta iniciativa, antecipando-se ao SUS. Eu, vereadora à
época, fui a autora da mesma e declaro isto sem nenhuma vaidade, apenas
para a senhora saber com quem
está falando.
Senhora
PresidentA, mesmo não tendo votado na senhora, torço pelo sucesso do seu
governo como mulher e como cidadã. Mas a maior torcida é para que não
lhe falte discernimento, saúde nem coragem para empunhar o chicote e
bater forte, se for preciso.
A primeira chibatada é o seu veto a
este Código Florestal, que ainda está muito ruim, precisado de muito
amadurecimento e aprendizado.
O planeta terra é muito mais
importante do que o lucro do agronegócio e a histeria da reforma agrária
fajuta que vocês estão promovendo.
Sou fazendeira e ao mesmo
tempo educadora ambiental. Exatamente por isto não perco a sensatez.
Deixe o Congresso pensar um pouco mais, afinal, pensar não dói e eles
estão em Brasília, bem instalados e bem remunerados, para isto mesmo. E
acautele-se durante o processo eleitoral que se aproxima. Pega mal
quando um político usa a máquina para beneficiar seu partido e sua base
aliada.
Outros usaram? E daí? A senhora não é os outros. A senhora á
a senhora, eleita pelo povo brasileiro para ser a presidentA do Brasil,
e não a presidentA de um partidinho de aluguel, qualquer.
Se conselho fosse bom a gente não dava, vendia. Sei disto, é claro.
Assim mesmo vou aconselhá-la a pedir desculpas às outras mães excluídas
do seu presente: as mães da classe média baixa, da classe média média,
da classe média alta, e da classe dominante, sabe por quê? Porque somos
nós, com marido ou sem marido, que, junto com os homens produtivos,
geradores de empregos, pagadores
de impostos, sustentamos a carruagem milionária e a corte
perdulária do seu governo tendencioso, refém do PT e da base aliada oportunista e voraz.
A senhora, confinada no seu palácio, conhece ao vivo os beneficiários
da Bolsa-família? Os muitos que eu conheço se recusam a aceitar qualquer
trabalho de carteira assinada, por medo de perder o benefício.
Estou firmemente convencida de que este novo programa, BRASIL
CARINHOSO, além de não solucionar o problema de ninguém, ainda tem o
condão de produzir uma casta inoperante, parasita social, sem
qualificação profissional, que não levará nosso País a lugar nenhum. E, o
que é mais grave, com o excesso de propaganda institucional feita
incessantemente pelo governo petista na última década, o Brasil está na
mira dos desempregados do mundo inteiro,
a maioria qualificada, que
entrarão por todas as portas e ocuparão todos os empregos disponíveis,
se contentando até mesmo com a informalidade. E aí os brasileiros e
brasileira vão ficar chupando prego, entregues ao deus-dará, na
ociosidade que os levará à delinquência e às drogas.
Quem cala,
consente. Eu não me calo. Aos setenta e quatro anos, o que eu mais
queria era poder envelhecer despreocupada, apesar da pancadaria de 1964.
Isto não está sendo possível. Apesar de ter lutado a vida toda para
criar meus cinco filhos, de ter educado milhares de alunos na rede
pública, o País que eu vou legar aos meus descendentes ainda está na
estaca zero, com uma legislação que deu a todos a obrigação de votar e o
direito de votar e ser votado, mas gostou da sacanagem de manter a
maioria silenciosa no ostracismo social, alienada e desinteressada de
enfrentar o desafio de lutar por um lugar ao sol, de ganhar o pão com o
suor do seu rosto. Sem dignidade, mas com um título de eleitor na mão,
pronto para depositar um voto na urna, a favor do político
paizão/mãezona que lhe dá alguma coisa. Dar o peixe, ao invés de ensinar a pescar, esta foi a escolha de vocês.
A senhora não pediu minha opinião, mas vai mandar a fatura para eu
pagar. Vai. Tomou esta decisão sem me consultar. Num país com taxa de
crescimento industrial abaixo de zero, eu, agropecuarista,
burro-de-carga brasileiro, me dou o direito de pensar em voz alta e o
dever de me colocar publicamente contra este cafuné na cabeça dos
miseráveis. Vocês não chegaram ao poder agora. Já faz nove anos, pense
bem! Torraram uma grana preta com o FOME ZERO, o bolsa-escola, o
bolsa-família, o vale-gás, as ONGs fajutas e outras esmolas que tais.
Esta sangria nos cofres públicos não salvou ninguém? Não refrescou
niente? Gostaria que a senhora me mandasse o mapeamento do Brasil
miserável e uma cópia dos estudos feitos para avaliar o quantitativo de
miseráveis apurado pelo Palácio do Planalto antes do anúncio do BRASIL
CARINHOSO. Quero fazer uma continha de multiplicar e outra de dividir,
só para saber qual a parte que me toca nesta chamada de capital.
Democracia é isto, minha cara. Transparência. Não ofende. Não dói.
Ah, antes que eu me esqueça, a palavra certa é PRESIDENTE.
Não sou impertinente nem desrespeitosa, sou apenas professora de latim,
francês e português. Por favor, corrija esta informação.
Se eu
mandar esta correspondência pelo correio, talvez ela pare na Casa Civil
ou nas mãos de algum assessor censor e a senhora nunca saberá que
desagradou alguém em algum lugar. Então vai pela internet. Com pessoas
públicas a gente fala publicamente para que alguém, ciente, discorde ou
concorde.
O contraditório é muito saudável.
Não gostei e
desaprovo o BRASIL CARINHOSO. Até o nome me incomoda. R$2,00 (dois
reais) por dia para cada familiar de quem tem em casa uma criança de
zero a seis anos, é uma esmolinha bem insignificante, bem insultuosa,
não é não, dona Dilma?
Carinho de presidentA da república do Brasil
neste Momento, no meu conceito, é uma campanha institucional a favor da
vasectomia e da laqueadura em quem já produziu dois filhos. É mais
creche institucional e laica. Mais escola pública e laica em tempo
integral com quatro refeições diárias. É professor dentro da sala de
aula,
do laboratório, competente e bem remunerado. É ensino
profissionalizante e gente capacitada para o mercado de trabalho.
Eu podia vociferar contra os descalabros do poder público, fazer da corrupção escandalosa o meu assunto para esta catilinária.
Mas não. Prefiro me ocupar de algo mais grave, muitíssimo mais grave,
que é um desvio de conduta de líderes políticos desonestos, chamado
populismo, utilizado para destruir a dignidade da massa ignara. Aliciar
as classes sociais menos favorecidas é indecente e profundamente
desonesto. Eles são ingênuos, pobres de espírito, analfabetos,
excluídos? Os miseráveis são. Mas votam, como qualquer cidadão
produtivo, pagador de impostos.
Esta é a jogada. Suja.
A televisão mostra ininterruptamente imagens de Desespero social.
Neste momento em todos os países, pobres, emergentes ou ricos, a
população luta, grita, protesta, mata, morre, reivindicando oportunidade
de trabalho. Enquanto isto, aqui no País das Maravilhas, a presidente
risonha e ricamente produzida anuncia um programa de estímulo à
vagabundagem. Estamos na contramão da História, dona Dilma!
Pode ter certeza de que a senhora conseguiu agredir a inteligência da
minoria de brasileiros e brasileiras que mourejam dia após dia para
sustentar a máquina extraviada do governo petista.
Último lembrete: a pobreza é uma consequência da esmola. Corta a esmola que a pobreza acaba, como dois mais dois são quatro.
Não me leve a mal por este protesto público. Tenho obrigação de
protestar, sabe por quê? Porque, de cada delírio seu, quem paga a conta
sou eu.
Atenciosamente,
Martha de Freitas Azevedo Pannunzio
Fazenda Água Limpa, Uberlândia, em 16-05-2012"
Política é uma #$@%,cada pessoa enxerga de um modo.Não concordo com 80% do que esta senhora diz,mas o bom é que temos a liberdade de falar,escrever e divergir também.Como diz o Humberto Gessinger...Há tantos quadros na parede,há tantas formas de se ver o mesmo quadro....
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